O cárcere sem muros...
![]() Dizem que nos últimos dias do horizonte das lendas, os quais deuses e homens ainda conviviam em luta e liberdade pela dor e satisfação daqueles que existiam, havia um copo de barro cozido, do qual se extrai um pó de terra molhado. O copo, jogado no chão arenoso, não tinha luxo ou poder para oferecer, apenas desejo... tragado aos poucos, sorvidos sem presa. E todos os dias, deuses e homens cortavam um pouco de seus pulsos e colocavam no copo de barro inerte seu sangue, para que ele pudessem aprisioná-los sem muros de concretos, aço ou tijolo, amarrando-os por forças ocultas a um outro que ali também depositava sua contrapartida latente. Após a viagem dos deuses e seu completo desaparecimento, os humanos desesperados perderam a crença no rito, desejando apenas estar sozinhos o bastante para não lembrar do amor dos deuses, de outros homens e do seu sangue saboroso. O copo se perdeu no tempo, e acabou se degradando, voltando ao ventre da mãe Terra. Entretanto a lama formada pelo sangue de deuses e humanos foi espalhado por meio daquilo que a mãe terra oferece voluptuosamente a humanidade, seu alimento, sua casa e seus passos. E assim nasceu a necessidade do próximo, da corrente e do desejo. Poucos conhecem a origem da crença e do ato, mas todos sofrem de seu malicioso e ingênuo fim, da sua imperiosa vontade do concreto de uma prisão sem muros, que não pode ser tocada e que nem ao menos tem guardas vigilantes dia e noite, apenas um portão aberto a sua frente. A mais íntima contradição e completude humana do sentir em liberdade. A dor do copo de barro se perpetua em oculto. O desejo do rito antigo cresce em silêncio nos corredores e ruas das cidades grandes, esquecidas ou natimortas, escrevendo poemas nos muros, espelhos embaçados ou na terra molhada pela chuva da tempestade. Sinto-me bem assim. Sabor colorido Geraldo Azevedo Mel... eu quero mel Quero mel de toda flor Da rosa, rosa, rosa amarela encarnada Branca como cravo, lírio e jasmim Eu quero mel pra mim Mel... você quer mel? Quero mel de toda flor Da margarida sempre viva, viva Gira, gira, girassol Se te dou mel pode pintar perigo E logo aqui, no meu quintal Cuidado, pode pintar formiga, viu? Mel... eu quero mel Quero mel de toda flor Colorido sabor... do mel de toda flor Antes que um passarinho aventureiro Que beija um beijo, doce sabor Sabor colorido Mel... eu quero mel Quero mel de toda flor Da assussena, violeta, flor de lis Flor de lótus, flor de cactos Flor do pé de buriti Dália, papoula, crisântemo Sonho maneiro, sereno, fulô do mandacaru Fulô do marmeleiro, fulô de catingueira Fulô de laranjeira, fulô de jatobá Das imburanas, baraúnas, pé de cana Xique-xique, mel da cana, cana do canavial Vem me dar um mel que eu quero me lambuzar Mel... eu quero mel Quero mel de toda flor Antes que um passarinho aventureiro Que beija um beijo, doce sabor Sabor colorido E por mais que você tente... estará ainda lá, até que se revolva todo o ventre da terra e de seu corpo... ![]() |
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