Sobre as coisas que nunca falei.
![]() Não é preciso ser tão sincero com as pessoas. Elas acabam não gostando disso. Não mesmo. Posso ser meio encucado com o que elas fazem. Mas falso não sou. Não sou mesmo. Posso até não falar a verdade de vez em quando, mas falso nunca. Jamais enganaria ninguém... Minha mãe já havia ouvido aquelas mesmas palavras trezentas vezes, eu poderia jurar que lá no fundo ela estava repetindo meu discurso com lábios imaginários e adivinhando cada palavra com um sorriso de canto de boca. Herdamos a péssima mania de minha avó. Ela me disse. Nunca a vi. Morreu antes. Infortúnio, dizia ela. O mesmo que levou tantos outros cantos de boca com sorrisos sarcásticos. Minha mãe era sarcatisca, eu acho. Não sei o que significa isso, mas o incomodo que me traz é intenso. Com raiva e medo dela já saber do que não estou sendo sincero. Ela tem poderes mágicos. Bruxas também. Não queria completar isso em minha mente, deve ter outra razão pra minha mãe não ser uma bruxa. Ela é do interior, e bruxas são sempre das grandes capitais romenas ou estadunidenses. Você rodeou, peru, mas, como sempre, não explicou nada. Ela me pegou. Perfeita sicronia de pergunta e olhar. Típico comportamento materno. Esta sem dúvida é uma espécie perigosa e ardilosa. Mais até que as bruxas. O que ela esperava de uma criança de poucos anos de experiência consciente neste mundo complexo e caótico? Não saiu uma palavra. Nenhuma. Defesa e ataque estavam perdidos àquela altura do campeonato. Bastava naquele momento decidir entre perder com honra ou receber um castigo mais leve, delatando os companheiros de luta. Ser sincero de vez em quando é bom. Ajuda as pessoas. Como eu, ela disse, sugerindo um suposto agrado por aquelas informações. Tensão. Ser ou não ser? Resisti bravamente, e o choro começou a sair. Acreditava que tinha uma chance até poucos momentos antes, mas este choro denunciador acabou com o restante das probabilidades de uma fuga cinematográfica. Fiz uma coisa errada. Me convenci que fiz apesar de estar na hora comigo mesmo ao ter feito. O meu choro é um grande argumento diante do meu juri. Minha mãe é uma pedra. Na verdade, a melhor definição é uma pedra de gelo, por que queima também. Ela não se importou nem com a primeira nem com a última lágrima. A santa inquisição materna (e que estava acima do pai, filho ou do espírito santo que nunca comparecia nestes moementos oportunos...) esperava meu corpo em sua grande fogueira e queria fazer um grande churrasco por ocasião do acontecido. Somente se passaram 5 minutos. Sei que lembrar disto depois de 15 anos de saído de casa não tem sentido algum. Somente olhar para o mesmo relógio velho e perceber que estou com uma saudade traiçoeira. Daquilo que não posso ter novamente. Eu acho. Não posso ser sincero se apanhei ou não. Seria fazer com que perdesse o interesse sobre o que falo. Minha mãe sim poderia dizer. Ela poderia tudo, até sorrir sarcasticamente. E eu, sentado a seu lado sorrio da mesma forma inconsequente. Talvez possa sentir seu medo e receio de estar sendo lida como um livro aberto. Até demais, descolando algumas páginas. Páginas soltas. Eu entreguei meus amigos. Foi legal, mas não fui sincero com minha mãe. E ela sabia e sorriu. Ela sorriu de uma maneira diferente, como se seus olhos fossem grandes faróis de luz castanha resplandecente. Não conhecia nenhuma dessas palavras antes. Agora sinto-me bem em poder definir isso pra alguém. Sendo sincero, acho que me conforta me explicar isso tudo e poder definir pra mim mesmo o que mamãe fez. Provavelmente nunca me falaria aquilo com a boca, somente com os olhos. Ela me deu uma carta de confiança por não ser sincero todas as vezes. Todas as vezes que posso fazer com que os olhos das pessoas se tornem faróis. Não é preciso ser tão sincero com as pessoas. Por ocasião do momento, ... /... / 2017 , entrego-me a teus braços. ![]() |
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