Take me out!
![]() Sei que não posso te levar numa mala, seria muito cômodo para minha pouca idade. Não se deve acostumar os jovens ao ócio, eles falam como tivessem 500 anos. Sempre me julgam jovem para isso ou aquilo. Eu não me importo. Acordei hoje cedo, mas por incrível que pareça não foi numa cama e sim na rua. Isso foi bem de repente. Isso. De repente, percebi minhas pernas num eterno movimento de passo sobre passo. É uma sensação dolorosa sentir todos os seus músculos contrairem a um só tempo. Será que desejo andar ou apenas o andar me deseja para existir pro restante das pessoas? A noosfera ainda está muito longe da minha rua, espero. Realmente espero, parecem espíritos. No descompasso quase cai de cara na terra fofa. Na queda fui jogado pra fora do meu corpo. Não quero que simplesmente acreditem nisso. Mas sintam. Eu saí de meu corpo (!). Meu corpo no chão e eu também, ao lado dele. Megulhei de volta em pouco minutos, é muito frio sentir a realidade pesada do fora do corpo. Mas foi divertido. Divertidíssimo. Eu via as pessoas por dentro. Lá no fundo vi tudo. Num falei nada a elas porque é falta de educação. Tive medo de perdê-las por saber algo que num me contaram, é isso. As pessoas tem medo (?) , e eu tenho medo (!), e o medo tem medo no final de tudo, talvez isso lhe dê um pouco mais de tempo de vida. Levantei depressa. Estava insano, e poderia simplesmente me classificar assim. Os insanos se acham loucos? Sob que parâmetro? Num me importo com isso também. Gritei a todos o ocorrido, mas estavam presos demais a sua carne pra me escutar. Será que morri por estar dizendo que saí do meu corpo? Que loucura... a essa altura do campeonato o real tava meio deformado no horizonte em forma de macarrão esparamado no chão sujo... Voltei para casa. Não pro meu corpo, entendam. Mas para o monte de blocos onde estão os meus ditos familiares. Eles nasceram antes de mim, e como num existia não posso confirmar se é real ou ilusão. Sentei no computador e fiz um manifesto. Take me out! Está ruim... as pessoas não me entenderiam em inglês. Queria falar para as poucas pessoas distantes que ainda não haviam pegado a doença chamada ciência. É contagiosa e letal. Causa cegueira, perda de audição e alergia crônica. Se bem que não tem nada haver com acessibilidade. Ou afinal, tem muito em comum com o acessível. Quero queimar as bruxas com os jalecos brancos. São bruxos em sua grande maioria, tenho certeza, mas a amiga história tem seu lado ciência doentio e complexado. Por isso, melhor colocar mulheres queimadas na fogueira por discordarem. Eu discordo. Pode me colocar pra fora (!) pra explodir tudo de uma vez. Não. Melhor implodir e deixar que tempo e espaço se encarreguem da sujeira. Não quero ter o trabalho de limpar tanto entulho. Distribuí o manifesto mesmo assim. Escandalizei escolas, igrejas, famílias, Estados, laboratórios e umas poucas meninas e meninos, que me viam como se estivesse nu. É pecado andar pelado e falando sobre o que está fora do corpo disciplinado e em ordem. Sou um menino mal. Mas também existe uma menina má dentro de mim. Ela é muito mais interessante. Simplesmente é divina e majestosa. Ela merecia ir pra fogueira por falar tantas palavras sujas. E ela foi. Sanatório educacional. Ordens de reprodução todos os dias. Almoço pago com suor da classe trabalhadora. E por fim, trabalhos forçados para manter corpo e alma sempre unidos. É melhor ser louco e ser posto pra dentro, pra um dia ser vomitado de tanto enjôo deste mesmo quadro pintado com o sangue coagulado dos outros. Faço desenhos nas paredes brancas, bonitas, luxuosas, masculinas e empresárias do meu pequeno cubículo, onde me servem ração e Coca-Cola. A ração ao menos ainda não é transgênica, apesar dos testes com animais já estarem concluídos e dos testes com a classe média estarem terminando (classe média transgênica?). Não tenho ainda dinheiro para comprar comida transgênica. Mas dizem que eu quero e preciso. Quero. Preciso. De Coca-Cola. Do quarto branco. Do piso vermelho e molhado, onde sinto diariamente uma parte de mim esterilizada, junto com meu grito abafado entre os muros do incompreensível. Espero que me visitem algum dia desses e possam me colocar pra fora (de vocês também...) (!) "Contos de um Malkhaviano. Não se assustem (por enquanto). Ainda não estão loucos se continuam sentados e chegaram até aqui..." ![]() |
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1 Comentario(s)
Fim de ano!
Não sei porque temos a ilusão de que no próximo ano tudo vai ser diferente... (maldita cultura ocidental, fundamentada em projeções e marcos lógicos insanos...).
Hora de ver quais os processos vão para frente e quais vão... para frente também! Mesmo que seja para mudá-los para um processo cautelar ou de execução! (sei que é um comentário cretino de uma pessoa esgotada no 8o semestre "no estudo do direito", mas que já tomou algumas decisões provisórias - sempre... - para continuar cantarolando!
De qualquer sorte...
Take me out!
Adoro vocês! (Povo que amo! Mesmo aqueles que não tem tempo para o café ou que estão em viagem a terras distantes!!! Espero que voltem algum dia para um abraço!!)
Obs: Estou um pouco sentimental hj... Isso não é necessariamente bom...
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