sábado, junho 30, 2007
O dente do macaco



Dizem que todos os sentimentos da alma ficam gravados no corpo.
E partes deles destoam provocando uma sensação estranha aos outros.
Com a morte não são libertados.
Ficam gravados a dor em pedaços dos corpos.
O dente do macaco me chamou no meio da rua.
Estava passando em meio a multidão.
Me chamou apenas.
E com um poderoso incômodo, me forçou a acompanhá-lo.


"Quanto custa?"

"Existem pessoas mano que não entendem o que a arte, que isso é um trabalho sabe, você que entende, sabe que isso é um trabalho sério né, tá ligado, pra você mano faço 5 reais"

"O que é isso?"

"É um dente de..."

"Só tenho 4,85, pode ser?"

"Pode sim"

"Isso é dente de que?"

"Como havia te falado é dente de um macaco. De vez em quando trago uns quando vou para Amazônia"

"..."

O dente do macaco me prendeu.
Mas o incômodo me impediu de usá-lo até a noite.
Outra vez.
O dente do macaco me traz uma sensação de solidão.
Solidão do macaco que não se sabe morto.
Talvez.
Solidão e ódio.
Quero usá-lo agora.
Para estar acompanhado.
Com a solidão alheia.
E o ódio que posso atenuar.
Do macaco sem dente.
Estou enlouquecendo aos poucos.
Deixem registrado.

Admito.
Colocado por Valdemiro as 1:14 PM 1 Comentário(s)

quinta-feira, junho 21, 2007
Canto da Cidade.


Há uma novidade nos cantos de boca do povo.
A porta está fechada, dizem eles baixinho ao pé do ouvido.
Alguns sorriem de satisfação com a surpresa repentina.
Outros sofrem com o receio de um perdão a muito tempo devido.
Casa pequena, desgraçada.
Se não a queimam, ao menos deveriam interditá-la.
Para que seus detroços não me cubram mais.
Com seu vazio.
Mas a ocasião faz a festa na cidade.
Abram os portos, dizem eles, sem muito pensar nos custos.
Sobre os céus e as nuvens, somente as marcas no mesmo corpo.
Que volta a sua terra, sem ao menos estar morto.
Alma penada, desgarrada de tudo e de todos.
Se não o procuraram antes, quando perdeu o brilho, por que estariam agora contigo, depois que a noite tomou conta do ultimo olhar perdido...
Do seu rosto.
Desfigurado.
Vai alma perdida, grita o que não quer.
Cala o que sente.
Arrebenta o que ama.
Mata o reflexo no espelho.
O que importa agora é que fechaste a porta.
Para dentro.
Da casa pequena e úmida.
Em sua pequena lembrança.
Casa pequena, desgraçada.
Se não a queimam, ao menos deveriam interditá-la.
Para que seus detroços não me cubram mais.
Com seu vazio.
Colocado por Valdemiro as 11:31 AM 0 Comentário(s)

sábado, junho 16, 2007
Sofia.


Minha filha se chamará Sofia.


Sofia de todos os meus sonhos.


Sofia, mesmo antes de nascer, tem meu amor incondicional.


Um amor tão grande que transcende a minha própria alma.


Aliás, será amada por muitos dessa forma, mesmo sem saber.


Sem saber o porquê.


De tanto amor ou querer.


Pois, minha filha, terá duas mães.


Uma está por vir.


A outra a espera antes mesmo que ela imagine.


Não tenho certeza da primeira, tão fugaz e passageira, que às vezes duvido se virá ou ficará para vê-la crescer.


A segunda amará como eu a amo, e será o retrato sorridente em que minha filha irá ter seu espelho.


Uma mulher de personalidade forte, olhos vivos, lábios entreabertos e força sem comparação neste lado da terra virgem.


Sentimento a flor da pele...


Temperada entrega completa àquilo que sinceramente a toca...


Minha filha terá os contornos de quem amo...


Por isso eu a amarei cada vez mais...


Até que a minha vida seja esvaziada pelo tempo...


E, no entanto, esteja repleta das lembranças que ainda trazem meu sorriso.
Colocado por Valdemiro as 12:51 PM 3 Comentário(s)

sexta-feira, junho 15, 2007
Por ocasião da catástrofe humana...



Existem duas faces no fato.
O fato do meu e o fato do seu.
Os fatos são expostos na faca.
Quem enfia a faca profundamente sempre mergulha no fato.
Humano ou não, o fato estará lá.
No fundo.
A dor da faca na pele é natural para quem corta na faca o fato, do meu e do seu.
Fato e acaso.
Faca e afiada.

Tenho a impressão que entrarei onde os fatos insinuam para a faca...
As impurezas que a faca e os fatos, do meu e do seu, tentam esconder.
Mas exalam espalhados por toda a esquina, a faca e os fatos.
Fatos expostos, Faca obscena.
Nos ladrilhos mais apagados dos fatos ou talvez na lâmina cega da faca.
Algo que a faca e o fato, do meu e do seu, teimam em não compreender.
Cortarás o dedo algum dia...
Colocado por Valdemiro as 8:44 PM 1 Comentário(s)